top of page

Zines, feito por fãs para fãs

Zines da série "Mó" carregam trechos de escritores clássicos com ilustrações atuais


Um garoto de apenas 5 anos inspirado por duas grandes paixões. A união entre o mundo vibrante do rock e o universo cheio das mais variadas histórias contidas em quadrinhos e páginas de gibis, mais tarde viria a se tornar sua maior influência. Criatividade de sobra e um talento natural para desenhar começaram a encher a cabeça desse menino de ideias e o fizeram ingressar num mundo à parte. Mesmo sem ter noção de que aquilo que ele se propunha a fazer era uma expressão artística que estava crescendo cada vez mais no país, o garoto foi aos poucos descobrindo uma paixão em sua vida e espalhando essa descoberta com seus amigos de infância.


Foi assim que Douglas Utescher, dono, juntamente com sua esposa Dani, da Ugra Press, loja especializada na venda de quadrinhos produzidos de forma independente, conheceu e se apaixonou pela arte de produzir fanzines. Ele conta que tudo começou “meio sem querer”. Influenciado por um tio que colecionava diversos exemplares de quadrinhos e por um primo fã de rock, passou a ter inspiração para criar desenhos que retratassem seus gostos e que transmitissem aos outros uma parte de sua personalidade.


“Eu gostava muito de desenhar desde moleque e quando eu tinha uns 10 anos, havia um outro coleguinha de classe que também gostava de desenhar e a gente falou ‘vamos fazer uma revistinha’”, conta Douglas ao lembrar de seu primeiro contato com essa expressão artística que começou como uma brincadeira de criança e, anos mais tarde, viria a se tornar coisa séria em sua vida. “Um final de semana ele [o colega] foi em casa e a gente inventou um personagem e fez umas histórias toscas. Falamos ‘vamos tirar cópia dessa história e fazer uma revistinha. Desenhamos uma capa, tudo em torno de 2 horas, e durante a semana tiramos umas cópias e vendemos esses gibis para a molecada que era da nossa classe. Na prática era um fanzine, mas a gente não fazia a mínima ideia de que aquilo ali já era um fanzine’”.


Os zines, gênero de quadrinhos ou revistas que são produzidos de forma independente, ou seja, sem as amarras das grandes editoras e livres de influências ideológicas do mercado, estão incluídos no universo das criações alternativas. Quando falamos em estilo alternativo, estamos nos referindo a manifestações culturais e artísticas relacionadas aos mais diversos campos de atuação, como por exemplo, música, cinema, artes plásticas, dentre muitas outras que fogem do que costumamos chamar de mainstream, ou seja, da cultura de massa, adotada pela grande maioria da sociedade. É nesse contexto alternativo que se encontra, desde os seus primórdios, o universo dos zines. Tratam-se de obras que reproduzem diversos temas da realidade de acordo com as pretensões de seus autores.



Douglas Utescher apresenta a Ugra Press



Histórias como a de Douglas mostram que basta uma folha de papel em branco, uma mente criativa e um lápis ou caneta na mão para começar a criar uma série de histórias que podem inspirar um número incontável de pessoas. O que pode começar com apenas um amontoado de rabiscos em meio à solidez de uma página comum, logo pode se transformar em experiências e informações que podem despertar a imaginação de outros leitores e até mesmo formar novos artistas com um arsenal infinito de narrativas, criando um ciclo sem fim.


Com um vasto currículo em sua carreira acadêmica, o jornalista e professor no curso de Comunicação Social da UFPB, Henrique Magalhães, produtor de fanzines e precursor no estudo acadêmico desta “mídia marginal”, é também autor de 4 livros sobre o tema: O Que é Fanzine? (1993), O Rebuliço Apaixonante dos Fanzines (2003), A Nova Onda dos Fanzines (2004) e A Mutação Radical dos Fanzines (2005). Magalhães revela que sua fixação pelos zines também começou em sua infância. “Primeiro copiava a partir das revistas que lia e gostava, como Luluzinha, Fantasma e Homem Aranha; Em seguida passei a fazer meus próprios desenhos, buscando criar algo original. Assim surgiu Maria, em 1975, que é minha personagem mais conhecida. Maria foi publicada em tiras diárias nos jornais paraibanos por muitos anos e agora sai em revista própria, a Maria Magazine, que está no número sete”.



criações de henrique magalhães e da marca de fantasia




O professor também cita a escola como peça fundamental para que ele tomasse gosto pela produção de quadrinhos. “Minha escola foi a observação e a intuição, quando queria fazer uma cena que não dominava, auxiliava-me com as obras em quadrinhos dos autores consagrados ou lia algumas revistas com dicas de desenhos. A prática sistemática é que vai transformando o desenho, gerando mais segurança e fluidez”, complementa Magalhães, que anos mais tarde fundaria sua própria editora, a Marca de Fantasia, voltada aos quadrinhos autorais e estudos sobre essa arte e outras temáticas da contracultura.


Um dos maiores representantes dos quadrinhos undergrounds brasileiros no cenário atual, o cartunista Francisco Marcatti Jr, conhecido por impor uma temática escatológica em suas obras, conta que conheceu o universo dos zines através dos quadrinhos, na década de 1970. “As revistas eram feitas em coletivos universitários e havia uma ligação muito forte entre a comunicação independente e o rock, e daí, a o pessoal começou a criar zines sobre rock, e, depois partiram para os zines em quadrinhos”.


Existem milhares de motivos que podem inspirar e influenciar uma pessoa a produzir um zine, mas, num ponto, todas essas produções se assemelham: a proximidade e a criação de um laço com seus leitores. Afinal, os zines são produzidos por fãs de determinado assunto, tendo como alvo pessoas com afinidades em comum. Resumindo, os zines são coisas de fãs feitas para fãs.


confira a entrevista com francisco marcatti jr.



Destaque
Tags
Nenhum tag.
Galeria de fotos
Entrevista - Douglas Utescher -
00:00
bottom of page